Com 11,2 mil quilômetros de fronteiras com sete países e área
equivalente a 42% do território nacional, a Amazônia é a maior
preocupação do Exército brasileiro. O medo, no entanto, não é de invasão
estrangeira ou de guerra na área.
Para a alta cúpula militar, a maior ameaça está em organizações não
governamentais (ONGs), que podem fomentar o separatismo, a venda ilegal
de terras indígenas, a apropriação indevida de recursos da floresta por
estrangeiros, além de impedir o desenvolvimento da região.
O G1 publica, ao longo da semana, uma série de
reportagens sobre a situação do Exército brasileiro quatro anos após o
lançamento da Estratégia Nacional de Defesa (END), decreto assinado pelo
ex-presidente Lula que prevê o reequipamento das Forças Armadas. Foram
ouvidos oficiais e praças das mais diversas patentes - da ativa e da
reserva -, além de historiadores, professores e especialistas em
segurança e defesa. O balanço mostra o que está previsto e o que já foi
feito em relação a fronteiras, defesa cibernética, artilharia antiaérea,
proteção da Amazônia, defesa de estruturas estratégicas, ações de
segurança pública, desenvolvimento de mísseis, atuação em missões de
paz, ações antiterrorismo, entre outros pontos considerados fundamentais
pelos militares.
“Trabalhamos com riscos. Não necessariamente você precisa invadir a
Amazônia para dominá-la. Há outras formas do Estado perder o controle.
Consideramos que existem algumas ONGs dentro da Amazônia que são
problemáticas; não temos o controle delas”, diz o general Walmir Almada
Schneider Filho, do Estado-Maior do Exército.
“Se você precisa desenvolver a região e, de certa forma, alguém impede o seu acesso e a atuação de órgãos públicos nela, você está perdendo o controle. E há ainda a venda de grandes lotes de terras públicas a empresários de outros países. Já enfrentamos essas dificuldades”, exemplifica o general, que é responsável por monitorar situações que possam resultar em crises ou conflitos que atinjam o interesse nacional. Em 2008, cálculos da CPI das ONGs apontaram que mais de 350 grupos atuavam na região.
“Se você precisa desenvolver a região e, de certa forma, alguém impede o seu acesso e a atuação de órgãos públicos nela, você está perdendo o controle. E há ainda a venda de grandes lotes de terras públicas a empresários de outros países. Já enfrentamos essas dificuldades”, exemplifica o general, que é responsável por monitorar situações que possam resultar em crises ou conflitos que atinjam o interesse nacional. Em 2008, cálculos da CPI das ONGs apontaram que mais de 350 grupos atuavam na região.
Para o comandante das tropas na Amazônia, general Eduardo Villas-Boas, a
ausência do Estado é a principal causa da região representar hoje a
preocupação número 1 dos militares.
“Em pleno século 21, o país ainda tem quase metade do seu território
não ocupado e não integrado à dinâmica nacional. Essa é uma tarefa
histórica que temos ainda por terminar. A Amazônia abriga as respostas e
soluções para os grandes problemas da humanidade: água potável,
biodiversidade, recursos minerais. Ela não pode ser um grande vazio e
nisso está a grande preocupação que temos em relação a ela”, afirma.
A Estratégia Nacional de Defesa (END), promulgada em 2008, colocou como
ponto-chave para o país manter a soberania da floresta, relacionando o
progresso com a manutenção do controle da Amazônia.
“O Brasil repudiará, pela prática de atos de desenvolvimento e de
defesa, qualquer tentativa de tutela sobre as suas decisões a respeito
de preservação, de desenvolvimento e de defesa da Amazônia. Não
permitirá que organizações ou indivíduos sirvam de instrumentos para
interesses estrangeiros - políticos ou econômicos - que queiram
enfraquecer a soberania brasileira. Quem cuida da Amazônia brasileira, a
serviço da humanidade e de si mesmo, é o Brasil”, diz o texto.
Nos anos 90, vários políticos estrangeiros defenderam que a mata
deveria ser “internacionalizada". Em 1989, o então vice-presidente dos
Estados Unidos, Al Gore, afirmou que, “ao contrário do que os
brasileiros pensam, a Amazônia não é deles, mas de todos nós”.
A mesma linha foi adotada pelos ex-líderes François Mitterrand, da
França, e Mikail Gorbachev, da União Soviética, que afirmaram que o
Brasil deveria aceitar uma “soberania relativa”.
Efetivo para defesa
Efetivo para defesa
O Exército divide o Brasil em sete grandes áreas. Apesar da Amazônia ser a maior em território (7 milhões de quilômetros quadrados), possui, proporcionalmente, o menor efetivo. Em 1950, eram apenas mil soldados. Hoje, são 27 mil homens responsáveis pela vigilância de um quinto das reservas de água doce e um terço das florestas do planeta. A biodiversidade da área vale mais de US$ 34 trilhões (R$ 70 trilhões) e compõe o maior banco genético da Terra, segundo documentos do Exército.
A divisa amazônica ainda é bastante permeável: são 21 pelotões
especiais de fronteira (PEF) para defender 11,2 mil quilômetros ao longo
de sete países vizinhos. Um grupo, com apenas 35 homens, é responsável
por 1.385 quilômetros de divisa seca na tríplice fronteira com o
Suriname e a Guiana Francesa. Um projeto pretende elevar o efetivo na
região para 48 mil soldados e construir mais 28 bases até 2030.
Os gastos para a ampliação são altos. A construção de cada PEF custa entre R$ 20 milhões e R$ 34 milhões para garantir o principal – uma pista de pouso e algumas habitações para os militares.
Os gastos para a ampliação são altos. A construção de cada PEF custa entre R$ 20 milhões e R$ 34 milhões para garantir o principal – uma pista de pouso e algumas habitações para os militares.
Segundo o general Villas-Boas, a construção de novas bases está
prevista no Sistema Integrado de Monitoramento de Fronteiras (Sisfron),
um projeto revolucionário que pretende transmitir, em tempo real, tudo o
que ocorre nas fronteiras. Para isso, serão usados radares, sensores
infravermelhos, raio-x, som e luz, além de câmeras em aviões não
tripulados,
O Sisfron ainda está em fase inicial. Em 2012, foi aberto processo licitatório. Os primeiros testes devem começar até o final do ano em Mato Grosso do Sul.
O Sisfron ainda está em fase inicial. Em 2012, foi aberto processo licitatório. Os primeiros testes devem começar até o final do ano em Mato Grosso do Sul.
“Nós estamos onde o Estado não está. Onde erguemos um PEF, a população
se aproxima, buscando energia, saúde, necessidades básicas”, diz o
general Villas-Boas. “E essa capilaridade nos impõe responsabilidades”.
Nas bases afastadas, o Exército constrói um pavilhão que pode ser usado por outras organizações federais e estaduais que atuam com meio-ambiente, indígenas, saúde, policiamento. As construções, no entanto, ficam sempre abandonadas.
A falta de infraestrutura básica para a população faz os militares serem procurados pela população para solucionar quase todos os problemas.
Aposentada mostra senha para consulta
médica
em ação dos militares (Foto: Tahiane Stochero/G1)
em ação dos militares (Foto: Tahiane Stochero/G1)
“Eu vim falar com uma ginecologista. Não tem médico que cuida disso na
cidade e nunca tive essa oportunidade antes”, diz a aposentada Raimunda
Nonato, de 52 anos, enquanto pegava uma senha, em maio, durante uma ação
social realizada por médicos do Exército em uma escola de Cleverlândia
do Norte, no Oiapoque, fronteira do Amapá com a Guiana Francesa.
“Meu filho está doente, vomita há dias, não consegue comer. Trouxe para
darem uma olhada. Se eu fosse para o SUS, teria que esperar dias para a
consulta”, afirma a doméstica Ocileni Santos da Silva, de 20 anos, que
carregava no colo o filho Ruani, que não parava de chorar.
Ao visitar um Pelotão Especial de Fronteira, em maio, o vice-presidente, Michel Temer, admitiu que a Amazônia é uma “casa abandonada”. “As fronteiras ficaram sem a presença do Estado ao longo do tempo. Vamos fazer reuniões para ocupá-las não só com militares, mas por meio das pessoas que já estão vivendo aqui e trazendo o Estado, com sua infraestrutura. Temos que estar presentes”, afirmou.
Ao visitar um Pelotão Especial de Fronteira, em maio, o vice-presidente, Michel Temer, admitiu que a Amazônia é uma “casa abandonada”. “As fronteiras ficaram sem a presença do Estado ao longo do tempo. Vamos fazer reuniões para ocupá-las não só com militares, mas por meio das pessoas que já estão vivendo aqui e trazendo o Estado, com sua infraestrutura. Temos que estar presentes”, afirmou.